Ministro Edson Santos fala sobre Estatuto da Igualdade Racial e Brasil Quilombola
O ministro da Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial, Edson Santos, conversou com âncoras de emissoras de rádio de todo o país, nesta quinta-feira, dia 24 de setembro. Ele esclareceu os principais pontos do Estatuto da Igualdade Racial, aprovado em comissão especial da Câmara dos Deputados no dia 9 de setembro de 2009. Entre os seus destaques, estabelece, por exemplo, que os orçamentos anuais da União contemplem as políticas destinadas ao enfrentamento das desigualdades raciais nas áreas da educação, saúde, trabalho, moradia, acesso à terra, segurança, financiamentos públicos e outros. Agora, o texto aguarda aprovação no Senado Federal.
12/12/2016
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APRESENTAÇÃO: KÁTIA SARTÓRIO - Na pauta do programa de hoje, as ações para aprovar o Estatuto da Igualdade Racial - projeto já aprovado em comissão especial da Câmara dos Deputados, no último dia 9 de setembro. O ministro Edson Santos vai explicar que o Estatuto estabelece, entre outras coisas, que os orçamentos anuais da União contemplem as políticas destinadas a um enfrentamento das desigualdades raciais nas áreas de educação, saúde, trabalho, moradia, acesso a terra, segurança, financiamentos públicos, entre outros assuntos. O ministro da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Edson Santos, já está aqui no estúdio e começa agora a conversar, ao vivo, com âncoras de emissoras de rádio de todo o país. RÁDIO EDUCADORA/ LARANJEIRAS DO SUL(PR) - ALDOIR COUTO: Ministro, a região do Território da Cidadania do Cantuquiriguaçu, cuja cidade polo é aqui em Laranjeiras do Sul, passa por um momento histórico em razão da criação da Universidade Federal da Fronteira Sul. O presidente Lula sancionou o projeto de criação da nova universidade no dia 15 de setembro agora, e tem, inclusive, um campus para ser instalado aqui em Laranjeiras do Sul. Aproveitando essa oportunidade, ministro Edson Santos, gostaria de saber do senhor que peso tem a educação, ensino, pesquisa e extensão nesse processo que sua secretaria promove para o enfrentamento das desigualdades raciais?MINISTRO: Eu diria que educação é o principal instrumento de inclusão e mobilidade social. Então, a melhoria da educação pública vai propiciar a que jovens negros, jovens pobres possam se qualificar para ingressar no mercado de trabalho. Agora, nós temos também um objetivo de oferecer oportunidades para aqueles que hoje já almejam chegar à universidade, fazer um curso técnico no Brasil. Daí a instituição de políticas afirmativas nas universidades públicas e nas escolas técnicas federais, no sentido de propiciar o acesso ao jovem negro, ao jovem pobre, numa formação acadêmica que lhe dê condição de se qualificar melhor para o mercado de trabalho. Então, a educação, a meu ver, é o grande desafio do Brasil. O Brasil só se transformará em uma grande nação na medida em que a gente tenha um sistema de educação público eficiente, e a educação é o principal instrumento de inclusão da população pobre e da população negra no mercado de trabalho de forma qualificada. RÁDIO EDUCADORA/LARANJEIRAS DO SUL(PR) - ALDOIR COUTO: Eu gostaria de aproveitar essa oportunidade, desse programa, que é ouvido em todo o Brasil, para estabelecer aqui em nome desta região, que tem um dos índices de desenvolvimento humano mais baixos do Paraná, um agradecimento ao governo federal, ao presidente Lula, por essa sensibilidade em criar a 11ª Universidade Pública em seu governo e instalar um campus aqui em Laranjeiras do Sul. Por isso, essa região hoje respira os ares de um ensino superior de qualidade, e o que é mais importante: público e gratuito. Muito obrigado a todos, bom dia ministro, bom dia, Kátia. RÁDIO ALIANÇA FM/ SÃO GONÇALO (RJ) - JOSÉ PERAZZO: Ministro, com a aprovação do Estatuto de Igualdade Racial (palavra inaudível) abrigaram (palavra inaudível) vivendo abaixo da linha da inclusão social dos direitos básicos de sobrevivência e políticos, no que diz respeito à já reconhecida população de mulheres negras, duplamente discriminadas na história do Brasil, o que essa numerosa segmentação populacional feminina negra pode aguardar, previsto no estatuto e nas políticas públicas de correção das injustiças promovidas pela sua Secretaria Especial de Políticas de Promoção de Igualdade, dando continuidade ou mudança no cenário de enfrentamento das questões raciais, e o papel de cada instituição no Brasil?MINISTRO: Primeiro, dizer que o estatuto, ele cria diretrizes para o Estado brasileiro atuar no âmbito da promoção da igualdade racial. O Estatuto, ele consolida toda uma legislação voltada para esse fim. Então, ele trata da área de saúde, educação, trabalho, moradia, juventude, participação política, acesso à terra... São vários temas da nossa vida que o estatuto aponta diretrizes, para nós atuarmos em prol, para que o Estado possa atuar em prol da população negra brasileira. Agora, nós temos, de uma forma mais direta, inclusive orientando as ações do governo na área de promoção da igualdade racial, que é o Plano Nacional de Promoção da Igualdade Racial, que foi decretado pelo presidente da República em julho desse ano, e que é um plano pactuado por vários órgãos do nosso governo e que estabelece políticas públicas voltadas à população negra no Brasil. Por exemplo, em relação à questão da mulher negra: tem a questão da saúde da população negra, que contempla principalmente as mulheres, no que se refere ao teste do pezinho, para detectar traço falci-fórmico quando do nascimento da criança; tem toda uma atenção especial voltada à mulher negra, que é vítima de hipertensão, principalmente no período de gravidez - daí ter-se a necessidade da realização de testes de pré-natal, para identificar problemas dessa natureza. Há casos até que levam à mortalidade materna por conta desse fenômeno que atinge a população negra brasileira, e em particular as mulheres negras em situação de gravidez. Então, não só o estatuto tem orientações para que nós atuemos no âmbito da promoção da igualdade racial. O governo do presidente Lula criou o Planapir, que vai determinar prioridades para elaboração dos planos plurianuais, as leis de diretrizes orçamentárias e as leis orçamentárias, que terão que observar a promoção da igualdade racial quando do envio dessas mensagens para o Congresso Nacional. RÁDIO SÃO LUIZ (MA)/ RENATO SOUZA: Ministro, está em tramitação no Congresso o Estatuto da Igualdade Racial. Mas, finalmente, esse estatuto vai contemplar todos os anseios e vai pôr fim às insatisfações em todos os setores da sociedade brasileira, ministro? MINISTRO: O estatuto não é uma panaceia, não é a solução para todos os problemas. Ele aponta um caminho para que nós superemos as desigualdades raciais no Brasil. O estatuto transforma essas políticas de promoção da igualdade racial em politicas de Estado. Na medida em que se transforma em lei, ele terá que ser observado por essa administração, que é a do presidente Lula, e pelas futuras administrações no Brasil. Então, eu diria que é um ponto de partida para que nós possamos desenvolver políticas voltadas à promoção da igualdade racial. Seria muita pretensão da nossa parte dizer que, votado o estatuto e sancionado pelo presidente Lula, todos os problemas das relações raciais no Brasil estariam resolvidos. RÁDIO SÃO LUIZ (MA)/ RENATO SOUZA: Ministro Edson Santos, essa luta que o senhor agora, como ministro, e o presidente Lula travam há muito tempo para tentar solucionar problemas como esse, que é grave a nível nacional, o senhor entende que o estatuto, embora ele não venha resolver definitivamente, mas irá apontar caminhos, meios para solucionar, nós vamos ter uma sociedade, a partir daí, um pouco mais justa? MINISTRO: Com certeza, na medida em que nós, enquanto Estado, governo, tenhamos uma política de resgate de um direito que foi sonegado à população negra quando da abolição da escravidão, que era exatamente naquela época, era a questão do acesso à terra, o Brasil era um país agrário, o acesso ao trabalho e o acesso à educação para qualificar o homem e a mulher negra para o mercado de trabalho, na medida em que esse direito que foi sonegado quando da abolição, que já faz 120 anos, seja resgatado e políticas implementadas no sentido de prover a população negra dessas politicas, certamente nós teremos um país mais igual. RÁDIO MONTANHESA 1500 AM - VIÇOSA (MG)/ PAULINHO BRASÍLIA: Ministro, o programa Território da Cidadania, do Ministério do Desenvolvimento Agrário, já destinou, em 2008, R$ 82 milhões para ações específicas de desenvolvimento regional e garantia de direitos sociais em comunidades quilombolas. Também em 2008, outros 12 projetos foram apoiados com R$ 1,9 milhão. O ano que vem, como é que o Ministério do Desenvolvimento vai trabalhar com essa comunidade?MINISTRO: Está em fase ainda de discussão o orçamento para o ano que vem. Mas, o que eu posso adiantar é que nós do governo federal, o presidente Lula nos convocou - eu, o ministro do Desenvolvimento Agrário, da Saúde, da Educação, de Minas e Energia e do Desenvolvimento Social -, no sentido de que priorizemos o atendimento às comunidades remanescentes de quilombo, principalmente no que se refere o acesso à regularização fundiária, à educação, com escolas, há um planejamento de até 2011 construir-se cerca de 110 escolas em comunidades quilombolas, do acesso à moradia, com o Ministério das Cidades... Enfim, uma série de políticas que visam contemplar as comunidades remanescentes de quilombo e melhorando a sua qualidade de vida. Já nesse ano, nosso propósito é titularmos cerca de 35 comunidades remanescentes de quilombo. O presidente Lula entende que ainda precisamos, até o final do seu governo, intensificar muito mais a assistência, a nossa presença junto a esse segmento da população.RÁDIO MONTANHESA 1500 AM - VIÇOSA (MG) - PAULINHO BRASÍLIA: Eu gostaria que o ministro também falasse em relação aos incentivos que as empresas poderão dar, poderão receber, tendo 20 empregados negros, eu não sei se é a partir desse ano ou a partir do ano que vem... Ele poderia falar um pouco mais sobre esse assunto.MINISTRO: Isso é um artigo que consta no Estatuto da Igualdade Racial que ainda vai passar pelo Senado e terá que ser regulamentado pelo governo a forma desse incentivo, como ele vai se dar e os detalhamentos dele. Na verdade, tem um artigo que trata genericamente, autoriza o Estado a realizar esse incentivo, mas não estipula uma percentagem, até porque isso requer um diálogo com o Ministério da Fazenda e Ministério do Planejamento, que não foi feito. RÁDIO NACIONAL BRASÍLIA/ KATIA SARTORIO: Ministro, ontem teve um ato aqui em Brasília e no Rio de Janeiro também, e em outros estados, sobre a intolerância religiosa. Na verdade, os movimentos de religiões afro-brasileiras e religiões africanas, também, estão mobilizados numa defesa de políticas públicas em favor dos adeptos dessas religiões que, segundo informações que a gente tem, sofrem ainda muito preconceito. Qual é a participação da secretaria nesse trabalho de conscientização sobre a intolerância religiosa, e também nessa promoção de políticas públicas? O governo está empenhado em trabalhar nisso, ministro?MINISTRO: Nós temos um trabalho, primeiro um diálogo com os praticantes das religiões de natureza africana no Brasil, temos desenvolvido primeiro censos - inclusive no Rio de Janeiro já está em andamento um censo para saber quantos são, como vivem, quais são as suas expectativas no sentido de construirmos políticas públicas voltadas a esse seguimento da população. Por outro lado, em função de perseguição e agressão que historicamente as religiões de matrizes africanas - o Candomblé e a Umbanda - sofreram no Brasil, teve período em que o Estado perseguia os praticantes dessas religiões. Então, nós temos desenvolvido também todo um plano de apoio e proteção ao presidente Lula, que no ano passado, em 20 de novembro reuniu-se com praticantes dessas religiões, e mais: essa questão da luta contra a intolerância religiosa, ela tem atraído outros segmentos religiosos - protestantes, católicos, judeus -, que se colocam solidários e parceiros do candomblé da umbanda no repúdio a atos de agressão que ocorrem no Brasil. Ontem, eu tive uma reunião com a CNBB, aqui em Brasília, e há um propósito deles de criar um fórum inter-religioso de diálogo da Igreja Católica com o Candomblé e a Umbanda. Então, eu acho que o Brasil é um pouco isso, o país da tolerância, é o país do diálogo. E nós, enquanto governo, temos buscado incentivar e apoiar as iniciativas que buscam isolar aqueles segmentos religiosos que são intolerantes, autoritários, e que querem fazer do Brasil um espaço apenas seu. Então, essa tem sido a posição de nosso governo.RÁDIO PETROLINA (PE)/ MARCELO DAMASCENO: Ministro, direto ao assunto, em meados do século passado, mesmo sem a política da cota racial, o jogador de futebol tinha alguma dificuldade em alguns clubes brasileiros. Mas, terminou Pelé, mesmo negro, se transformando em um rei do futebol. Agora, para este século que nós estamos, com o Estatuto da Igualdade Racial, nossa preocupação é a seguinte: já estão pedindo cota racial para as eleições do país em nível municipal, em nível estadual e em nível federal. Isso não transforma numa coisa folclórica, essa questão da igualdade racial no Brasil? Não seria mais inteligente a cota sócio-econômica, anterior a essa questão da cota racial?MINISTRO: Primeiro, eu queria complementar a resposta à pergunta da Kátia. Ontem, nós tivemos essa manifestação das comunidades religiosas aqui em Brasília. No Rio de Janeiro, nós tivemos mais de 50 mil pessoas, em Copacabana, no domingo passado. E, no dia 22 de novembro, ocorrerá a marcha na Bahia. Então, é um crescente essa questão da mobilização dos segmentos religiosos no Brasil com o apoio do governo federal.KÁTIA SARTÓRIO: Contra a intolerância religiosa!MINISTRO: Contra a intolerância. Voltando à pergunta do Marcelo, o Brasil tem problema de desigualdade social que atinge a população pobre brasileira de uma forma geral. Agora, o Brasil tem um problema de relação racial. A população negra, que será maioria no Brasil a partir do próximo censo, segundo indicadores do próprio IBGE, ela encontra-se na base da pirâmide social brasileira. A nossa pirâmide social é branca no topo e negra na base. Então, isso é uma distorção que é ruim para o nosso país, que é a segunda população negra no mundo. Então, como a segunda população negra no mundo não tem representação diplomática à frente de empresas e até de governos negros? Então, as políticas de promoção da igualdade racial visam corrigir esse mal que aflige o nosso país. Seria incorreto nós termos apenas políticas que combatam as desigualdades raciais, assim como seria incorreto enxergarmos que o problema do Brasil é apenas social. São as duas coisas. Eu acho que nós temos que caminhar com as duas pernas, buscando oferecer à população brasileira, de uma forma geral, políticas públicas que reduzam as desigualdades, que vai desde a elevação do salário-mínimo, acesso à escolaridade, mas temos que dar um recorte racial nessas políticas, mostrando que o Brasil não é essa democracia racial que foi afirmada durante grande parte da nossa República. Então, é uma responsabilidade nossa construir políticas que visem superar essas desigualdades também.RÁDIO PETROLINA (PE)/ MARCELO DAMASCENO: Estou aqui no Nordeste, em Petrolina, fincado no meio de uma caatinga 'braba', transmitindo ao vivo isso aqui, para toda uma comunidade universitária que me ouve, também através da televisão, e é o seguinte: a Univasf, Universidade Federal de Petrolina, ela abriu agora 50% de suas vagas no vestibular para estudantes oriundos da rede pública. Porque a comunidade acadêmica entende aqui que na senzala entre Petrolina e Juazeiro, e aqui nos grotões nordestinos, tem negro, mas também tem muita gente branca nessas senzalas. É apenas para complementar e reconhecer que realmente existe esse preconceito racial velado no Brasil. Mas, juntando-se a isso também a questão econômica, que de alguma forma exclui pessoas também da raça branca, ministro.MINISTRO: O que eu quero te dizer é que se você tiver contato com o projeto que tramita no Senado da República, ele contempla cota social com recorte racial. Têm lugares no Brasil, como Salvador, que 80% da população é negra. Então, a cota social vai ter um recorte de acordo com o peso da população negra em cada região. No caso de Salvador, 80%. No caso, por exemplo, do Rio Grande do Sul, que me parece, é 9% ou 12%, nós teremos cotas sociais com recorte racial de 12% ou 9%, dependendo do peso da população negra. Agora, não dá, eu acho que é uma hipocrisia do Estado brasileiro, manter na invisibilidade a temática racial. Esse é um passivo que o Estado brasileiro tem que resgatar. Foram 350 anos de trabalho escravo, são 121 anos de abolição que Joaquim Nabuco - inclusive um Pernambucano -, ele dizia que o Brasil ia levar 100 anos para superar o trauma da escravidão. E nós estamos há 121 anos da abolição da escravidão e esse trauma ainda permanece com a população negra colocada em uma situação ainda marginal no processo econômico de nosso país.KÁTIA SARTÓRIO: Ministro, ainda falando sobre esse assunto de cotas, o Supremo Tribunal Federal começa a realizar, em março, audiências públicas para discutir políticas de cotas raciais nas universidades. Como a Secretaria participa desse processo?MINISTRO: Nós dialogamos quem tem a responsabilidade de representar o governo, a Advocacia-Geral da União, com quem nós temos um diálogo excelente, muito bom.KÁTIA SARTÓRIO: A AGU?MINISTRO: A AGU. E também atuamos no sentido de diálogo com a sociedade civil e com setor privado. Vou te dar um exemplo: nós tivemos uma reunião com a Febraban, que tem um programa de inclusão de negros no setor financeiro, e ela se dispõe a ser ´amicus curiae´, ou 'amiga da Corte', que é uma forma da Febraban chegar ao Supremo Tribunal Federal e mostrar o caráter positivo dessas políticas afirmativas no Sistema Financeiro brasileiro, dando a condição de que jovens negros e negras se qualifiquem para serem gestores financeiros no Brasil. Tivemos ontem também uma reunião com a CNBB, que eu aqui já falei, e uma das coisas que foi colocada até pelos membros da CNBB, que é a necessidade do posicionamento da instituição e de que ela se posicione efetivamente sobre dois temas: de cotas e de quilombo. Então, o nosso papel é exatamente de dialogar com segmentos da sociedade buscando levar ao Supremo a manifestação desses seguimentos e demonstrando, com isso, a oportunidade da adoção dessas políticas.KÁTIA SARTÓRIO: Só para contextualizar, a gente sabe que tem uma ação ajuizada no Supremo contra a Universidade de Brasília. E os Democratas, que são os autores dessa ação, sustentam que essa reserva de vagas pode agravar o preconceito racial. Qual é a opinião do senhor?MINISTRO: Eu acho que já houve uma evolução dos partidos nesse campo. Porque nós votamos o Estatuto da Igualdade Racial, que tem um princípio das políticas de ação afirmativa, e que foi aprovado de forma unânime, contando inclusive com voto e declaração de voto de representantes do partido Democratas. O que eu entendo é que a temática racial vem assumindo um peso na sociedade brasileira. A sociedade vem se mobilizando e se posicionando sobre esse tema, o que faz com que as lideranças partidárias, sensíveis ao clamor da sociedade, venham evoluindo em seu posicionamento. Então, eu acho que tem sido positivo, do ponto de vista da evolução política desse tema no Brasil.RÁDIO NOVA ALIANÇA - BRASÍLIA (DF)/ EDSON CIPRIANO:  O Estatuto da Igualdade Racial foi festejado por muitos. Eles enumeram várias conquistas, entre as quais dão um destaque especial ao Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial (SINAPIR). Eu peço ao senhor que fale um pouco sobre esse sistema.MINISTRO: Na verdade, nós buscamos reproduzir em nível da implementação de políticas públicas, o que tem sido exitoso na área da educação e também na área de saúde, que é vislumbrar uma descentralização dessas políticas. Evidente que o estatuto é o ponto de partida pra toda uma discussão, mas é fundamental que haja essa descentralização em nível de estados e municípios. E o Sistema Nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, nós já temos hoje um fórum, que é o FIPIR, que é o Fórum Intergovernamental de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, mas o sistema inserido no estatuto, ele visa institucionalizar essa relação política institucional do governo federal, dos estados e dos municípios no âmbito das políticas de promoção da igualdade racial. O governo federal, por exemplo, tem um plano nacional de implementação da Lei 10.639. É evidente que o Ministério da Educação não será responsável pela implementação dessa política pública na ponta. A Lei 10.639, é a lei da história da África e a revisão da história do Brasil, inserindo o negro na formação do Estado brasileiro. Isso não será possível o MEC implementá-lo na ponta, no sistema de ensino brasileiro. Então, é necessário um diálogo com gestores estaduais, gestores municipais no âmbito dessa política, para que ela possa, efetivamente, se descentralizar e capilarizar por todo o Brasil. Então, o Sistema Nacional de Política de Promoção da Igualdade Racial tem esse objetivo.RÁDIO NOVA ALIANÇA - BRASÍLIA (DF)/EDSON CIPRIANO: Tem um outro lado, ou seja, quem não ficou satisfeito com o estatuto o considera um retrocesso. Ele cita um ponto como a redução para candidatos em partidos, a falta de cotas nas universidades, definições precisas sobre quilombolas e sobre o que é racismo. Dizem eles que prejudicaram o pisto. O que o senhor tem a dizer sobre isto? MINISTRO: Eu recomendo a essas pessoas que leiam o estatuto em seu conjunto. Porque tudo o que está sendo colocado como questionamento consta no estatuto. A questão da definição do que é racismo é o artigo 1º do estatuto. O artigo que fala de cotas é o artigo 16 do estatuto e o artigo de fala de quilombo são os artigos 33, 34 e 35 do estatuto. Mas eu sugiro, até para que a gente possa fazer um diálogo com esses segmentos, é que se faça a leitura do estatuto, ele ainda vai tramitar no Senado da República e ele deve ser visto em seu conjunto, dos 70 artigos que o compõem. Agora, eu respeito as opiniões divergentes. Qual de nós tem a pretensão de ser unanimidade nesse país?RÁDIO LÍDER FM - SÃO JOSÉ DO RIO PRETO (SP)/JOICE CREMONESI: Bom dia, ministro. Bom, ministro, o estatuto, ele estabelece que parte dos orçamentos anuais da União contemplem as políticas destinadas ao licenciamento das desigualdades sociais. Com relação a isso, de que forma será feita a distribuição desse dinheiro com relação aos municípios, já que cada município enfrenta uma realidade diferente? Por exemplo, aqui em São José do Rio Preto, nós não encontramos comunidades quilombolas como na região de Sorocaba. Então, de que forma será feita a distribuição dessa verba?MINISTRO: As políticas de promoção da igualdade racial são transversais. Por exemplo: nós na Seppir, em nível do governo federal, nós não concentramos todos os recursos da promoção da igualdade racial. Muito pelo contrário, a Seppir tem uma pequena parcela de recursos do orçamento para articular e coordenar essas políticas em nível de governo, que estão distribuídas por vários ministérios - de Desenvolvimento Agrário, Educação, Saúde, Ciência e Tecnologia, Trabalho, enfim, por vários ministérios e órgãos do governo federal. O que nós recomendamos é que os municípios e estados constituam órgãos de promoção da igualdade racial com viés transversal, porque nós não podemos criar um espaço (inaudível). A saúde da população negra é construída no Ministério da Saúde, mas a sua implementação fica por conta das secretarias estaduais e das secretarias municipais de Saúde. Não sei se deu pra você compreender esse mecanismo. RÁDIO LÍDER FM - SÃO JOSÉ DO RIO PRETO (SP)/JOICE CREMONESI: Bom, ministro, muito se discute com relação a essa questão da desigualdade. A questão do preconceito, de que forma o estatuto contempla isso, já que o preconceito está impregnado na sociedade. De que forma o estatuto, ele vem não só como uma forma de dar benefícios e oportunidades para os negros, mas também com relação à população branca, que ainda tem esse pensamento, essa questão do preconceito, como aquele homem que foi agredido em São Paulo, quando foi abrir o veículo. Era um veículo bom e o segurança achou que ele estava assaltando o veículo. Então, a partir dessas questões é que nós vemos que a questão do preconceito ainda está impregnada na nossa sociedade. De que forma o estatuto também tem algum tipo de ação com relação a isso?MINISTRO: Na área da educação, que o preconceito se combate com conhecimentos. O preconceito já se diz, é 'pré-conceito', já tem um conceito antes de conhecer o fato. Então, essa coisa do Brasil que se consolidou da incapacidade do negro de desempenhar determinadas funções, de que ao negro estão relegadas as funções menos qualificadas, de que o negro no mercado de trabalho, mesmo desempenhando funções iguais, recebe menos do que o branco, e a mulher negra ainda menos do que o homem negro. Esse fenômeno, nós combatemos com conhecimento - daí a importância da implementação da Lei 10.639, que consta no estatuto, que é exatamente inserir no nosso sistema de ensino noções da formação do Estado brasileiro, do conhecimento, da história do continente africano. Nós, quando estudamos, tivemos noção da história antiga de Grécia, Romam história modernam da Revolução Francesa, da Guerra de Secessão, nos Estados Unidos, mas não tínhamos uma linha no que se refere à história da África. Então, é importante, no combate ao preconceito, que a criança no seu ingresso no nosso sistema de ensino saiba que metade da nossa população veio da África, e que essa metade da população tem uma história, e que esse segmento, quando chegou aqui no Brasil, deu uma contribuição importantíssima em várias áreas da nossa vida - na ciência, na cultura, em várias áreas - para a formação do Estado brasileiro. Com isso, possuidor desse conhecimento, certamente o preconceito será bastante reduzido.KÁTIA SARTÓRIO: Lembrando a todos os ouvintes e telespectadores que a íntegra do estatuto, que já foi aprovado pela comissão especial da Câmara dos Deputados, está na internet, em www.presidencia.gov.br/seppir.  Eu entrei agora no site e está fácil, ministro.RÁDIO FM SERGIPE - ARACAJÚ(SE)/ ANDRÉ BARROS: E no momento em que se discute este Estatuto da Igualdade, que está sendo considerado como um avanço, a gente vê as dificuldades. Por exemplo, em Sergipe, temos comunidades quilombolas bem tradicionais, enfim, e essas comunidades são atendidas pela Funasa. Então, se vê uma dificuldade hoje que é justamente você ter que (inaudível) por uma lado, mas na prática, no dia-a-dia, a questão dos recursos, das condições de trabalho que tem que ser desenvolvido, há uma dicotomia. Eu queria que o senhor falasse o quê que o senhor pretende, a partir de agora, fazer para melhorar essa relação da própria Funasa, dos estados com essas comunidades quilombolas, no caso específico aqui de Sergipe, por exemplo.MINISTRO: As comunidades de quilombo fazem jus a uma série de políticas públicas, que vai da regularização fundiária, do acesso à energia elétrica, ao saneamento básico, à moradia, à educação, à saúde, de maneiras que o presidente da República está empenhado em rever este quadro que o senhor está colocando. Nós temos tido reuniões com o presidente, inclusive com a participação, também, da Funasa, e eu creio que esse quadro de uma certa dificuldade no desenvolvimento de políticas voltadas às comunidades remanescentes de quilombo será superada. Tem um problema também, que é no âmbito de elaboração de projetos. O governo federal tem o recurso, mas é fundamental que o estado ou o município entre com o projeto, até como forma de contrapartida desses entes na ação junto com o governo federal. E não só a Funasa, a Caixa Econômica, nós temos encontrado dificuldades junto aos estados e municípios na elaboração de projetos. Vamos, inclusive, anotar sua observação, vamos entrar em contato com a Funasa, com o governador Marcelo Déda, e também com o prefeito da sua cidade - Aracaju -, vamos entrar em contato com o governador, se for o caso, com o prefeito de Aracaju, que é o Edvaldo, entraremos em contato no sentido de termos uma ação coordenada - governo federal, estado e município - no sentido de dar celeridade a essa ação de saneamento no estado de Sergipe.RÁDIO SUPER VALE - CRATEÚS (CE)/MARCELO CHAVES: Aqui, no município de Crateús, mais precisamente numa comunidade há 20 quilômetros, Queimadas, há uma grande polêmica: a questão de um território que está sendo identificado como quilombola, e, enquanto isso, moradores que moram há mais de 50 anos, já vêm de família para continuação, e, agora, com esse decreto presidencial que foi assinado alguns anos atrás, estava indicado como quilombolas, e hoje há a dúvida, como é que fica a situação, mais precisamente em Crateús, no estado do Ceará?MINISTRO: Especificamente sobre Crateús, não tenho como me posicionar, até porque é preciso ter um conhecimento mais detalhado da situação. Agora, quilombola é uma iniciativa da comunidade - princípio da autodefinição - a comunidade se autodefine como quilombola, busca um contato com o governo federal, a Fundação Palmares faz o trabalho da certificação dessa comunidade, e a partir da emissão do certificado é que a comunidade é tida como quilombola, e o Ministério do Desenvolvimento Agrário, através do Incra, faz o estudo antropológico, faz a demarcação da área referente a essa comunidade. Não é qualquer pessoa que pode se dizer 'eu sou quilombola', tem que ter um estudo que é feito em função disso, da permanência e da história dessa comunidade; tem que haver comprovação histórica para ser declarado quilombola. Então, isso deve ser, no estágio em que está a situação em Crateús, mas eu acho que deveria se buscar um contato com a Fundação Palmares e com o Incra para que possam se resolver esses impasses referentes a essa comunidade. RÁDIO JORNAL 820 AM - GOIÂNIA (GO)/TONI: Aqui no Goiás há a presença de algumas comunidades quilombolas urbanas. Porém, há muitas no campo, também, de difícil acesso para que este programa possa ser implantado. Esse Estatuto da Igualdade Racial e o Programa Brasil Quilombola prevê o acesso também e moradia de melhor qualidade para essas pessoas, haja vista algumas de lá não conhecerem nem se quer televisão?MINISTRO: Eu estive recentemente na comunidade de Calunga, em Goiás, no município de Cavalcante. É uma comunidade de difícil acesso, estamos dialogando com o Ministério da Integração Regional, no sentido da construção de uma estrada que ligue a comunidade à cidade de Cavalcante, o prefeito da cidade está muito envolvido com isso e está colaborando na área da elaboração do projeto para darmos conta dessa necessidade da comunidade, tem o problema do acesso à energia elétrica e saneamento básico... Enfim, nós estamos atento a essa realidade de Goiás. A comunidade de Calunga terá seu certificado de desapropriação assinado pelo presidente da República até dia 20 de novembro desse ano, é o prazo que foi dado para concluirmos este processo. E eu diria que esta questão de quilombo, nós temos que dar, efetivamente, mais celeridade. Concordo e absorvo a crítica que você faz, no sentido de nós sermos mais efetivos na assistência a esse segmento da população.RÁDIO ARAPUAN - JOÃO PESSOA (PB)/ GIOVANNI MEIRELLES: Aqui, na Paraíba, a gente nota a Funasa mais acompanhando a questão dos índios. Aqui, temos a descendentes de índios Potiguaras. E a minha preocupação, ministro, é mais global, porque também em relação ao Incra, temos alguns problemas, por exemplo: o Ministério da Cultura - Fundação Palmares -reconheceu 23 quilombos, e tem mais 12 em processo de reconhecimento, em um total de 35. Doze, inclusive, são urbanos - um em João Pessoa mesmo, em Paratibe, e o outro no município de Santa Luzia, na Serra do Talhado, que são remanescentes inclusive de negros comunistas - uma comunidade perseguida bastante nos anos 60. E o Incra não tem acompanhado, tem apenas uma área quilombola já desapropriada, que é na comunidade Bomfim, município de Areia. A minha pergunta é mais global. A gente acha que alguns setores do governo, de uma forma ou de outra, estão mais lentos, não têm o mesmo time , não têm o mesmo ritmo que o senhor, no seu trabalho tem, que é muito rápido, é muito eficiente. Então, como encontrar uma sincronia melhor entre Caixa Econômica, Eletrobrás, a questão do combate à fome nesse trabalho que o senhor coordena?MINISTRO: Olha só, eu quero fazer justiça aqui aos colegas ministros, em especial ao Guilherme Cassel, que tem se empanhado muito nessa questão quilombos, nós temos reunido constantemente para tratar desse tema. Agora, o Estado brasileiro, durante um bom tempo, ele foi desaparelhado. A falta de pessoal, de técnicos, para dar conta dessa demanda de quilombo é muito grande. Então, isso acaba dificultando a nossa atuação enquanto governo. Eu sei que o Incra tem dificuldade pessoal para atender a essa demanda, e isso é fruto de um processo recente que o Brasil viveu, aonde se falava muito em enxugamento da máquina sem se dar conta que o enxugamento da máquina ia trazer uma dificuldade muito grande para segmentos mais vulneráveis da população que precisam que o poder público, a União e os estados, os assistam na área de saúde e de educação. E com uma visão de enxugamento de máquinas, de não contratação de servidores, isso gerou uma dificuldade que o nosso governo ainda enfrenta nesse momento. Mas, eu quero aqui reconhecer essa critica que você faz e nós não podemos também ficar sentados e dizer que a máquina não está aparelhada para dar conta dessa demanda. O que nós temos é que acertar os parafusos da máquina para que ela tenha celeridade no desenvolvimento de política. A questão da certificação é feita pela Fundação Palmares, como você bem colocou, mas aí é a fase mais difícil, é a fase da regularização fundiária, de indenização no caso de pessoas que estejam ocupando as áreas de quilombo, e isso requer um trabalho mais detalhado e mais moroso, eu diria.RÁDIO ALTERNATIVA FM / VÁRZEA GRANDE (MT) / JEFERSON LARANJA: Ministro, o senhor esteve aqui no último dia 18, junto com a senadora Serys Slhessarenko, visitando a primeira capital de Mato Grosso, Vila Bela da Santíssima Trindade, onde o senhor teve a oportunidade de conhecer as ruínas da igreja matriz, que foi construída em 1769. E também foi recebido com a linda manifestação cultural, com a dança do Conde e a dança do Chorar. A pergunta é o seguinte, ministro: o poder público conhece essa manifestação popular como patrimônio cultural? Se conhece, como se dá esse reconhecimento e se exite algum tipo de incentivo?MINISTRO: Olha só, o reconhecimento é com o Ministério da Cultura, com o Iphan, que, por exemplo, transformou o samba carioca em patrimônio imaterial e também a capoeira. Então, tem que ter um diálogo com o Ministério da Cultura no sentido de inserir essas manifestações culturais enquanto patrimônio imaterial nosso. Então, esse é o procedimento, nós aqui não temos expertise nessa área, não. Mas foi muito boa a recepção aí, não só o congado, mas também a comida, os peixes que nós comemos aí na cidade de Vila Bela. Eu fico muito agradecido à recepção que tive, calorosa e carinhosa, da população dessa cidade.RÁDIO ITACAIUNAS /MARABÁ (PA)/ NONATH CARVALHO: Ministro, a nossa pergunta aqui na região de Marabá, estado do Pará, é a seguinte - são duas perguntas em uma: Essas cotas separadas para universidade, para candidaturas e também para outros tipos de agregação de valores da raça em outros segmentos, isso não já significa uma maneira de discriminar, até certo ponto, uma discriminação? E a outra pergunta seria: Quais foram as evoluções da conquista da desigualdade social, até porque nós temos já há centenas de anos que foi assinada a Lei Áurea, mas parece que até hoje a etnia ainda não foi reconhecida como uma raça normal, como qualquer uma outra?MINISTRO: Você responde a primeira pergunta com a segunda pergunta. Na verdade, é isso mesmo, há constatação da desigualdade no Brasil. Há amparo na Constituição para a política de discriminação positiva que hoje já tem um histórico voltado para portadores de necessidades especiais, para as mulheres, que são 30% de vagas nos partidos e coligações, e para negros, dada a sub-representação da população negra no parlamento, 10% nos partidos para candidatos negros. Nós achamos que esse é um caminho para o Brasil superar esse estado de desigualdade durante um período de tempo mais curto possível.APRESENTADORA KÁTIA SARTÓRIO: Ministro Edson Santos, muito obrigada por sua participação mais uma vez no Bom Dia Ministro.MINISTRO: Foi um prazer estar aqui com vocês.APRESENTADORA KÁTIA SARTÓRIO: A todos que participaram comigo dessa rede, o meu muito obrigada e até o próximo programa.